Em Tempo Algum

Caíra a noite e o viajante pedia socorro a Deus.

Sentia-se doente.

Longa fora a caminhada.

Doía-lhe o corpo.

Estava exausto.

Orando sempre, encontrou árvore acolhedora que lhe pareceu agasalhante refúgio.

No pé do tronco anoso, grande cova caprichosamente forrada de raízes era leito ao luar.

- Oh! - suspirou o viajor fatigado - Deus ouviu-me! Afinal, o repouso!

Ajoelhou-se e ia estender o manto roto no chão, quando verdadeira nuvem de maruins surgiu no assalto.

Picadas na cabeça, no rosto, nas mãos, nos pes...

E eram tantos os dardos vivos e volantes em derredor que o pobre recuou espavorido, para dormir ao relento, entre as pedras e espinheiros da retaguarda.

De corpo dorido, pensava desalentado:

- Tolo que sou de acreditar na oração! Estou sozinho! Nada de Deus!

Na manhã seguinte, porém, retomando a marcha, voltou à árvore do caminho e, somente aí, reconheceu, admirado, que a grande cova de que fora obrigado a afastar-se era a moradia de vários escorpiões.

*

Não descreia da prece em tempo algum. E nos casos em que você encontre empecilhos para possuir o a que mais aspira, guarde, entre aborrecimentos e provações, a certeza de que, muitas vezes, o que lhe parece uma situação invejável não passa de ninho enganador, onde se ocultam os lacraus da morte.

VIEIRA, Waldo. Bem Aventurados os Simples. Pelo Espírito Valérium. FEB.