Piedade Fraternal

Perfeitamente natural é o sentimento de compaixão pelos que padecem aflições inominadas no carreiro das provações humanas.

A dor, mercadejando os interesses aflitivos, convoca as atenções para as feridas que expõe no corpo dilacerado dos que lhes caem nas malhas, esperando socorro.

Lágrimas copiosas, gritando misericórdia aos ouvidos atentos à musicalidade dos sofrimentos, aguardam o lenço que lhes enxuguem todas as expressões de infortúnio.

Soledade falando baixinho à necessidade de um braço amigo, de uma companhia discreta e de um auxílio, em forma de migalha de entendimento a fim de diminuir o abismo do vazio interior.

Viuvez e orfandade apresentando angústias indescritíveis na expectativa de compreensão, de modo a tornar menos ácido o cálice horrendo de desespêro e de mágoa.

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A piedade fraternal, que é o amor em começo, filha dileta da caridade excelsa, logo descobre como co-participar de todo esse triste festival de angustias no cenário desolador das dores humanas.

No entanto, mui difícil é a dádiva da piedade fraternal, à presunção, à soberbia.

Pelas características de que se revestem, o presunçoso e o soberbo, a ira nos que o cercam é o primeiro sentimento que investe promovendo reações imediatas às suas atitudes ferintes.

Ao lado do ingrato assinalado pelo esquecimento de todo o bem que recebeu, a atitude próxima é a da revolta que assoma no coração generoso do doador, agora cioso por um pronto desforço.

A agressividade desta ou daquela natureza compõe naturalmente um quadro de reações que o instinto engendra, oscilando entre a perspicácia da contrariedade ao azedume cruel do ódio que conseguem, não poucas vezes, roubar a paz tisnando a lucidez dos que lhe são vítimas indefesas.

Piedade, piedade para os maus, os ingratos, os soberbos, os cruéis porque são possivelmente membros de um organismo social dos mais doentes, porquanto ignoram o câncer que os vitima por dentro, mais próximos do aniquilamento da vaidade do que eles próprios supõem.

O sofrimento resignado nos compunge, a dor discreta nos comove, as lágrimas em silêncio nos chamam à compaixão, mas, é piedade também o ato de paciência ao lado do rebelde, do conduzido pelo corcel fogoso das paixões arbitrárias que nos humilha e nos aguilhoa, zombando muitas vezes do nosso valor, por ignorância total da infelicidade que portam consigo.

A piedade é um sentimento multiface, que todos devemos agasalhar no coração.

Como é verdade que Jesus se compadeceu da pobre mulher surpreendida em adultério, que ignorava a sandice atormentadora e a obsessão de que era objeto, convém não esqueçamos que ante a surra da ingratidão geral que o levou à Cruz, o seu último pensamento e suas últimas palavras foram a rogativa ao Pai para que perdoasse os crucificadores e os traidores, pois que eles não sabiam o que estavam a fazer, ensinando com a eloquência do exemplo a mais sublime página de piedade fraternal, que continua qual luminoso roteiro para o homem através dos tempos sem fim, até o dia em que seja possível a perfeita fraternidade Universal.

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"Tende cuidado em não praticar as boas obras diante dos homens, para serem vistas, pois, do contrário, não recebereis recompensa de vosso Pai que está nos céus". Mateus: capítulo 6º, versículo 1.

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"Todos então se porão sob a mesma bandeira: a da caridade, e as coisas serão restabelecidas na Terra, de acordo com a verdade e os princípios que vos tenho ensinado". Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo 23º - Item 16, parágrafo 2.

FRANCO, Divaldo Pereira. Florações Evangélicas. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. LEAL. Capítulo 58.