Mãe

Quando Jesus ressurgiu do túmulo, a negação e a dúvida imperavam no círculo dos companheiros.

Voltaria Ele? perguntavam, perplexos.

Quase impossível.

Seria Senhor da Vida Eterna quem se entregara na cruz, expirando entre malfeitores?

Maria Madalena, porém, a renovada, vai ao sepulcro de manhãzinha. E, maravilhosamente surpreendida, vê o Mestre, ajoelhando-se-lhe aos pés.

Ouve-lhe a voz repassada de ternura, fixa-lhe o olhar sereno e magnânimo. Entretanto, para que a visão se lhe fizesse mais nítida, foi necessário organizar o quadro exterior. O jardim reacendia perfumes para a sua sensibilidade feminina, a sepultura estava aberta, compelindo-a a raciocinar. Para que a gravação das imagens se tornasse bem clara, lavando-lhe todas as dúvidas da imaginação, Maria julgou a princípio que via o jardineiro. Antes da certeza, a perquirição da mente precedendo a consolidação da fé.

Embriagada de júbilo, a convertida de Magdala transmite a boa-nova aos discípulos confundidos. Os olhos sombrios de quase todos se enchem de novo brilho.

Outras mulheres, como Joana de Cusa e Maria, mãe de Tiago, dirigem-se, ansiosas, para o mesmo local, conduzindo perfumes e preces gratulatórias. Não enxergam o Messias, mas entidades resplandecentes lhes falam do Mestre que partiu.

Pedro e João acorrem, pressurosos, e ainda vêem a pedra removida, o sepulcro vazio e apalpam os lençóis abandonados.

No colégio dos seguidores, travam-se polêmicas discretas.

Seria? Não seria?

Contudo, Jesus, o Amigo Fiel, mostra-se aos aprendizes no caminho de Emaús, que lhe reconhecem a presença ao partir do pão e, depois, aparece aos onze cooperadores, num salão de Jerusalém. As portas permanecem fechadas e, no entanto, o Senhor demora-se, junto deles, plenamente materializado. Os discípulos estão deslumbrados, mas o olhar do Messias é melancólico. Diz-nos João Marcos que o Mestre lançou-lhes em rosto a incredulidade e a dureza de coração. Exorta-os a que o vejam, que o apalpem. Tomé chega a consultar-lhe a chagas para adquirir a certeza do que observa. O Celeste Mensageiro faz se ouvir para todos.

E, mais tarde, para que se convençam os companheiros de sua presença e da continuidade de seu amor, segue-os, em espírito, no labor da pesca. Simão Pedro registra-lhe carinhosas recomendações, ao lançar as redes, e encontra-o nas preces solitárias da noite.

Em seguida, para que os velhos amigos se certifiquem da ressurreição, materializa-se num monte, aparecendo a quinhentas pessoas da Galiléia.

No Pentecostes, a fim de que os homens lhe recebam o Evangelho do Reino, organiza fenômenos luminosos e linguísticos, valendo-se da colaboração dos companheiros, ante judeus e romanos, partos e medas, gregos e elamitas, cretenses e árabes. Maravilha-se o povo. Habitantes da Panfília e da Líbia, do Egito e da Capadócia ouvem a Boa-Nova no idioma que lhes é familiar.

Decorrido algum tempo, Jesus resolve modificar o ambiente farisaico e busca Saulo de Tarso para o seu ministério; entretanto, para isso, é compelido a materializar-se no caminho de Damasco, a plena luz do dia. O perseguidor implacável, para convencer-se, precisa experimentar a cegueira temporária, após a claridade sublime; e para que Ananias, o servo leal, dissipe o temor e vá socorrer o ex-verdugo, é imprescindível que Jesus o visite, em pessoa, lembrando-lhe o obséquio fraternal.

Todos os companheiros, aprendizes, seguidores e beneficiários solicitaram a cooperação dos sentidos físicos para sentir a presença do Divino Ressuscitado.

Utilizaram-se dos olhos mortais, manejaram o tato, aguçaram os ouvidos...

Houve, contudo, alguém que dispensou todos os toques e associações mentais, vozes e visões.

Foi Maria, sua Divina Mãe.

O Filho Bem Amado vivia eternamente, no infinito mundo de seu coração.

Seu olhar contemplava-o, através de todas as estrelas do Céu e encontrava-lhe o hálito perfumado em todas as flores da Terra.

A voz d’Ele vibrava em sua alma e para compreender-lhe a sobrevivência bastava penetrar o iluminado santuário de si mesma.

Seu Filho - seu amor e sua vida - poderia, acaso, morrer?

E embora a saudade angustiosa, consagrou-se à fé no reencontro espiritual, no plano divino, sem lágrimas, sem sombras e sem morte!...

Homens e mulheres do mundo, que haveis de afrontar, um dia, a esfinge do sepulcro, é possível que estejais esquecidos plenamente, no dia imediato ao de vossa partida, a caminho do Mais Além.

Familiares e amigos, chamados ao imediatismo da luta humana, passarão a desconhecer-vos, talvez, por completo.

Mas, se tiverdes um coração de mãe pulsando na Terra, regozijar-vos-eis, além da escura fronteira de cinzas, porque aí vivereis amados e felizes para sempre!

Pelo Espírito Irmão X

XAVIER, Francisco Cândido. Luz no Lar. Espíritos Diversos. FEB. Capítulo 7.