A Conchinha Falante

Em um lugar à beira-mar, denominado Praia das Conchas, os bichinhos da floresta gostavam de passear, observando a linda paisagem e, principalmente, as conchas coloridas deixadas na areia, numa enorme variedade de tamanhos e formatos que encantava a todos.

À tarde, Emeus um jovem macaquinho ia lá e pegava todas as conchinhas que conseguia. Escolhia as mais bonitas e as colocava em uma cestinha, feita de cipó, para levar para casa.

Certo dia, viu uma linda conchinha perto de uma pedra. Quando se aproximou, ouviu uma voz:

- Olá... como vai você?

Tomou o maior susto e deu um salto para trás.

- Quem está aí? - perguntou intrigado.

Chegando mais perto da conchinha percebeu que havia um bichinho dentro dela, lhe dando um lindo sorriso disse:

- Olá amiguinho! Eu me chamo Aluminosa, e você?

- Eu me chamo Emeus! - respondeu ainda meio assustado...

- Muito prazer, Emeus. O que você faz aqui?

- Eu pego estas conchas e as levo para casa.

Ela olhou dentro da cestinha e viu um monte de conchas.

- Emeus, para que você precisa de tanta casinha assim?

- Casinha? Onde?

- Sim; o que você tem aí na sua cesta podem ser casinhas que eu e meus familiares usamos. Sem elas morreríamos na boca de algum peixão guloso. E o que faz com elas?

- Nada! Só pego porque é bonito e quero ter para mim...

Aluminosa, que era muito esperta, percebeu que Emeus sofria de um mal muito grave que se chamava egoísmo. Ele recolhia as conchinhas sem cuidado, sem prestar atenção. Não verificava se a ostra ainda viva, habitava a casinha que ele colecionava. Pensou em como poderia ajudá-lo. Deveria fazê-lo entender que estava agindo de forma errada. Pensou... pensou... e perguntou:

- Amiguinho, você acha seu pêlo bonito?

- Sim, eu acho lindo! - respondeu com um salto.

- Eu também. Imagine se eu resolvesse arrancar todo ele e levar para minha casa. Você sentiria muito frio, não é mesmo? Isso é um mal que eu não desejo a você. Levando conchas para casa, com ostras vivas dentro, muitas iguais a mim morrerão, o que é um mal ainda maior...

Emeus ficou um pouco envergonhado mas, maroto como era, mudou logo de assunto:

- Você quer conhecer minha casa? Tenho um quarto cheio de brinquedos.

- Com o maior prazer! - respondeu Aluminosa dando um lindo sorriso.

O macaquinho, não querendo dar o braço a torcer resmungou:

- Também, não iam caber mesmo todas estas conchas e você na minha cesta. Vamos, então.

Emeus colocou Aluminosa na sua cestinha e foi correndo para casa.

Chegando lá foi direto para o seu quarto de brinquedos.

Tirou Aluminosa da cesta e ela ficou maravilhada!

- Puxa! Que quarto lindo você tem!

- Todos esses brinquedinhos são meus! - e pulava de um lado para o outro jogando tudo para cima.

Ficaram os dois ali, Emeus fazendo algazarra, quando Aluminosa, que estava perto da janela, viu outros macaquinhos que pareciam estar tristes.

Ela ficou observando... observando... e perguntou:

- Emeus, você conhece aqueles macaquinhos?

- Quais? - correu até a janela para ver...

- Hummm... - fez uma cara feia – são meus vizinhos! Eles vieram aqui pedir que eu lhes emprestasse alguns de meus brinquedos e eu não emprestei nada! - falou com desprezo.

- Eles estão tão tristes! - falou, também, Aluminosa com tristeza.

- Mas eu é que não vou emprestar nadinha para eles, eu não!

Aluminosa pensou:

- O mal é mais sério do que eu havia imaginado. Como farei para auxiliá-lo?

Percebeu que lá fora alguém cuidava das plantas. Dirigiu-se ao macaquinho e perguntou:

- Emeus, quem é aquela senhora que trata com carinho das plantas?

- É minha mãe.

- O que ela faz?

- Está regando as plantas, por quê?

Aluminosa ficou quieta por um tempo, olhando e pensando...

Tornou a perguntar: - Por que sua mãe rega as plantas?

- Ora, amiguinha! - respondeu com superioridade – você não sabe que se não regar as plantas elas irão morrer?

Vendo que o nosso amiguinho estava atento, não demorou para passar a lição:

- Assim também são as nossas amizades, Emeus, se você não as regar com carinho e atenção elas irão murchar, como a planta que ficou lá, maltratada e sem água. Sua mãe oferece o que ela possui de melhor para as plantinhas. Elas também lhe respondem com o melhor, enfeitando, perfumando e alimentando a todos. Você deve fazer assim também com os seus amiguinhos.

- Mas se eu emprestar meus brinquedos para eles, o que ganho em troca?

- Eles ficarão felizes.

- Serão mais amigos?

- Não, você não entendeu.

Chegou o rostinho mais próximo ao dele e disse:

- Você não pode comprar o amor e a amizade com seus brinquedos. Você fica feliz com seus brinquedos e os vizinhos ficarão também. Se vierem a ser seus amigos por causa disso, ou não, é outra história. O certo é que se você fizer alguém feliz, você se sentirá muito feliz também, pode apostar. Independentemente dele gostar ou não de você, entendeu?

- Bem, se eles não gostarem de mim, que vantagem levo nisso?

- Observe a sua mamãe... Às vezes, ela rega as plantas, faz tudo direitinho e mesmo assim algumas delas morrem, certo?

- É verdade...

- E nem por isso ela deixa de regar todas e está sempre feliz porque fez a sua parte. Assim também é com a amizade. Se você fizer tudo direitinho, fizer a sua parte e mesmo assim receber ingratidão, faça igual à sua mãe, continue oferecendo seu amor e atenção. Sabe por que ela faz isso?

- Não, por quê?

- Porque ela tem a certeza de que o pezinho doente irá florir novamente e, se isso não acontecer, nascerá um muito mais bonito no lugar.

- Estou entendendo o que você está falando, mas, não vejo vantagem alguma...

Nesse momento ele olhou para sua amiguinha e viu que ela estava meio diferente.

- Aluminosa, o que está acontecendo com você?

- Bem, meu amigo, agora é hora de você colocar em prática tudo o que ouviu hoje.

- Como assim? - perguntou meio perturbado...

- Eu fiquei muito tempo longe do mar e não estou muito bem.

- Você está passando mal?

- Sim, e você deve me levar de volta, o mais rápido possível, senão acabarei morrendo.

- Entendo. Pegou rapidamente a amiguinha, e, então...

- Espere um pouco! Pensou, e, percebendo o que estava acontecendo, começou a chorar:

Você não pode ir! É minha! Descobri você! É minha melhor amiguinha! Que farei sozinho?

- Emeus, preste atenção. Acabou de dizer que sou sua, porque me achou. Mas se me mantiver aqui, vou morrer. E agora?

- Tudo o que temos, nossos amigos, brinquedos, nos alegram e enriquecem a vida, mas, em verdade, não nos pertencem. Dentre as conchinhas que você acumulou todo esse tempo, e ficaram jogadas em seu quarto, sem serventia, muitas continham ostras vivas que vieram a morrer, por sua falta de responsabilidade e egoísmo.

- Observe seu comportamento. Onde você chega, deseja tudo; o que vê, quer levar para casa! Essa vontade de TER o acompanha em todos os lugares: na praia, no quarto, com seus amigos... Deseja ser rico, mas sente-se sempre pobre. Então quer mais e mais e mais. Relacionando-se dessa maneira com o mundo, será sempre infeliz, feio diante das pessoas e sempre insatisfeito.

- Você tem em suas mãos a decisão sobre minha vida ou minha morte, mas a minha presença junto a você não é mais permitida.

Tentou dar um sorriso, mas já estava desfalecendo. Já não conseguia falar e começou a fechar lentamente os olhinhos.

Percebendo que a situação estava crítica, Emeus pegou-a e saiu correndo em direção à praia. Chegando lá, arremessou-a longe e ficou olhando, para ver se havia chegado a tempo de salvar sua amiguinha. Queria vê-la reanimada e feliz.

Ficou ali, esperando por alguns instantes, até que ouviu um grito:

- Emeus... Emeus!

Era Aluminosa, no meio de uma onda, acenando para ele.

Quando a viu, sentiu uma alegria tão grande, que pulava... e pulava...

Aluminosa percebeu o que acontecia. Observou que a alegria de Emeus era real; ele estava feliz porque a havia salvado. Vencera, afinal, o egoísmo!

Extremamente feliz, também, Aluminosa falou-lhe:

- Você me fez feliz! Agora minha felicidade lhe pertence! Quando alegramos um coração, criamos vida a nosso redor e nos sentimos repletos de amor, único sentimento que alegrará nossa alma. Volte para sua casa, amiguinho Emeus, e faça sempre o melhor que puder em favor de todos.

O macaquinho despediu-se da amiga. Não podia conter sua imensa alegria! Saiu pulando e cantarolando, pois nunca havia se sentido tão rico em toda a sua vida.

DIAS, Robson. A Conchinha Falante. Pelo Espírito Vovó Amália. 3.ed. FEB, 2003.